Última alteração: 2021-04-29
Resumo
A pesquisa histórica e sociológica sobre a escuta musical traz à tona a questão do espaço – geográfico, social ou midiático – no qual, e do qual, emergem experiências vividas com a música. Nesse sentido, a iconografia musical se coloca como um campo importante para a investigação de tal fenômeno, na medida em que revela contextos, sujeitos e discursos inscritos nas práticas musicais e na realidade social a que se refere. Diante disso, a presente pesquisa buscou compreender como espaços e práticas de escuta musical se apresentam no Acervo Iconográfico Musical do Curso de Música da Universidade Federal de Uberlândia, assim como refletir, a partir das fotografias, sobre as relações de performer e ouvinte difundidas, mesmo que despretensiosamente, nas práticas performáticas do referido curso de música. Para este estudo foram selecionadas fotografias do Acervo, realizadas discussões relacionando a iconografia musical aos conceitos de espaço social e escuta musical, e, por fim, refletiu-se sobre a operação da escuta musical mediada por diferentes espaços e contextos sociais; o que, consequentemente, trouxe à tona uma análise sobre a potencialidade da iconografia para o estudo das práticas musicais de escuta. Vale pontuar que o referido Acervo está em processo de recuperação e organização, e que compreende, atualmente, cerca de 1710 fotografias produzidas entre os anos de 1957 e 2004. A riqueza de tal material iconográfico musical no estudo da escuta pode ser estimada a partir da constatação de diversos musicólogos e educadores musicais que apontam para a dificuldade de registros, externalizações e materializações da escuta enquanto prática musical. Se, de uma perspectiva psico-cognitiva, autores como Sloboda e Bamberger levantam dados sobre a escuta musical a partir de registros gráficos das audições, de uma perspectiva socioeducativa musical os registros iconográficos abrem uma possiblidade estendida para a análise da escuta musical em seus espaços de processualidade – para além de uma abordagem estritamente acústica ou que entende o espaço apenas na sua dimensão física. Partindo da educação musical como prática social, uma categoria analítica se fez central para a compreensão da escuta: a de espaço social na perspectiva de Lefebvre. Entendendo o espaço para além da lógica do recipiente e do conteúdo, ou da contenção dos sentidos e dos corpos, o autor francês destaca três modos de operação do mesmo, que também foram, na presente pesquisa, eixos do estudo iconográfico: a prática espacial, as representações do espaço e os espaços de representação. Nesse sentido, a partir das análises, é possível reconhecer o caráter histórico da escuta musical, que, codificado em elementos iconográficos do espaço, apontam para a importância das mediações sociais no modo de organização da percepção humana. Conclui-se que a fotografia é uma fonte de pesquisa privilegiada no que tange ao estudo da escuta musical, dado sua capacidade de não apenas materializar as configurações espaciais de fenômenos musicais, mas grafar as dimensões não sonoras da música que conformam a escuta, tais como a sociabilidade, a corporalidade, a interação e a discursividade.