Última alteração: 2020-04-11
Resumo
A presente intervenção busca identificar e discutir o uso de iconografia musical nos impressos produzidos na Tipografia de Manoel Antonio da Silva Serva e dos seus herdeiros (1811 - 1846). Estabelecida na capitania da Bahia, a Tipografia Serva, a primeira imprensa privada a funcionar na América portuguesa, teve treze fases e foi mantida pelos herdeiros do empresário, após sua morte em 1819. Nas suas prensas foram produzidos mais de cinco centenas de livros, folhetos, gravuras e jornais, sendo que alguns deles estampavam imagens de instrumentos musicais, cujos elementos iconográficos não foram inseridos apenas em caráter decorativo.
Em alguns impressos, essas vinhetas que representavam instrumentos musicais, bem como outros elementos iconográficos, serviram como uma forma comunicação e identificação dentro de uma obscura rede de sociabilidade que atuou na Bahia, clandestinamente, desde o início do século XIX. A introdução de três lojas maçônicas na referida capitania, entre 1802 e 1813, levando a criação de uma potência maçônica denominada Grande Oriente Brasileiro (1813-1817), fomentou uma profícua rede intelectual que utilizava signos impressos como forma de expressar ideias, conceitos e pertencimento entre os iniciados.
A publicação da revista As Variedades (1812), a primeira que se imprimiu no Brasil, já apresenta no seu frontispício explícitas insígnias maçônicas, cuja iconografia inclui o esquadro, o compasso, o malhete, Livro da Lei, o Sol e a Lua. A referida revista, que só teve três números, cuja redação pode ser a atribuída a Diogo Soares da Silva de Bivar, possivelmente em associação com o padre Ignacio José de Macedo, revela as ligações da Tipografia de Serva com as redes de pedreiros-livres que se estabeleceu na Cidade da Bahia.
Assim, em outros impressos, especialmente entre 1814 e 1817, também podem ser identificados uma variada iconografia musical cujos significados podem ser compreendidos pelos iniciados na maçonaria, permanecendo aos demais leitores apenas como elementos gráficos decorativos. Em um poema maçônico, disfarçado de versos bíblicos, impresso em 1815 fora estampada uma Lira, instrumento que está associado a um dos cargos dentro de uma loja maçônica, o Mestre de harmonia. O padrão se repete em outros impressos da mesma tipografia e essas representações merecem um olhar mais cuidadoso, inserindo a iconografia no contexto político que a produziu. Compreender essa iconografia, expressa em ideia de simbologia, percebendo-a como uma forma de comunicação e de identidade pode revelar aos pesquisadores as chaves e códigos de um período de significativa importância na História da Bahia.